terça-feira, 5 de julho de 2011

O Hino do IRRA


Fundado com desusado fervor revolucionário e com os estatutos aprovados em assembleia particularmente efusiva, o IRRA (Intervenção Revolucionária da Resistência Armada) reuniu-se na sua sede provisoriamente por enquanto definitiva, a esplanada do Lelo, que hoje anda extremamente ocupado para trás e para a frente com a carrinha, uma Renault Kangoo recuperada num ferro-velho amigo, agora detido na penitenciária de Pinheiro da Cruz depois de ter sido condenado a 22 dias, 16 horas, 34 minutos e 54 segundos, por um juiz picuinhas e maníaco por relógios de cuco e cronómetros desportivos do Tribunal Criminal de Sintra, acusado de importação ilegal de viaturas, falsificação de cartas de condução, viciação de matrículas, livretes, assédio sexual à porteira com libidinosas insinuações sobre tamanhos e modelos de "tubos de escape", contrafacção de moeda falsa sob a forma de fotocópias a preto e branco de notas de 55 euros e agressão tentada na forma de puxar pela gravata para fora do balcão o funcionário da filial da CGD aqui da zona quando pretendia levantar um cheque de 448,76 euros com um saldo negativo de 653,59 euros negativos na conta. 
"Por serem assim vigaristas com os clientes é que agora vos acabaram com a mama das "golden porras"  (o tipo não lia o Diário Económico que a malta papa para ver se os rendimentos esticam e os meses encolhem) e por isso não fixava lá muito bem os termos técnicos da alta finança porque lá em casa à hora dos Prós e Contras a mulher queria era estar refastelada no sofá depois de esfregar o lava-loiça a ver a "Sedução" e a praguejar a sua má sorte por ter ido na conversa do então namorado, agora marido, atrás da árvore monumental do Jardim do Príncipe Real, quando lhe ofereceu as três preciosidades que mantinha desde que nasceu a troco de promessa de uma faustosa vida de princesa num castelo de moradia à beira-mar com carro e "chauffeur" à porta e acabou acanhada num T1 em décima primeira mão no Algueirão a passar o dia agarrada aos tachos, panelas, comida, montes de roupa para passar e mais ainda para lavar com aquele ranhoso que não mexe uma palha e foge da esfregona como o Diabo da Cruz e passa o tempo a mandar SMS para as amigas transeuntes  das bermas das estradas de Corroios e das matas de Fernão Ferro) aqui e na EDP, GALP, Continente (onde é que ele foi descobrir esta que nem o próprio Belmiro Azevedo sabia?), TLP (ó homem, estás desactualizado, essa empresa já acabou há anos e agora é a PT, ignorante) e outros buracos para enfiarem os gatunos dos partidos", berrava ele, quando era levado para a esquadra de Queluz pelos agentes Anselmo e  Andrade para o carro-patrulha minúsculo onde mal se podiam manejar os cassetetes nos casos mais bicudos. 
Na lufa-lufa de preparar o mais rapidamente possível o "polvo à lagareiro" que na ementa exterior do café-restaurante constava como "Á polvo há lagareiru", o Lelo passava e repassava com os pneus carecas da Renault Kangoo sobre os tentáculos e a cabeçorra dos cadáveres dos octópodes (ah pois é, o que julgavam?) para os tornar macios ao mastigar, como exigem os clientes da casa, na sua grande maioria com dentes a menos e dentaduras postiças a mais, porque os cheques-dentistas  com que o anterior governo do "supostamente licenciado" não passaram de mais uma fraude eleitoral para os desdentados votarem na perpetuação do bando político-partidário do Largo do Rato no poder. 
Já satisfeito com a "receita", o Lelo estacionou a carrinha em segunda mão entalado o carro da Liliana, uma deusa grega do streap-tease no "Elefante Branco" e que ele (o Lelo) anda doido por "trincar" e utiliza este truque primário de engate para meter conversa todos os dias com a especialista da arte de despir, passou pela esplanada e, orgulhoso do seu trabalho, disse ao Al Trokas: "Vê lá esta beleza de polvos...Apálpa-os para ver como ficaram tenrinhos..." 
"Olha que a última vez que disseste para apalpar a coisa saiu-te cara...", ironizou o Al Trokas, de tal maneira que o Lelo, ao lembrar-se da história, enfiou-se rapidamente dentro da cozinha, onde aumentou 1 metro de estatura ao colocar o chapéu de "chéf" na cabeça redondinha, que muito bem poderia entrar e ganhar um "casting" para anunciar bolas da Adidas ou da Puma. 
"Quem é que iam apalpar?", perguntou o sr. Santos, que ouvira só uns extractos da conversa, antes de puxar da cadeira e sentar-se na mesa do Al Trokas. 
"Não te esqueceste de nada, cabeça de vento?", perguntou o Al Trokas. 
O sr. Santos, meio embaraçado, começou à procura não sabia de quê nos bolsos do casaco. Hoje já não envergava o traje revolucionário. Vestia fato azul, camisa branca e gravata azul e óculos escuros. 
"Tinhas-me pedido alguma coisa que eu me esqueci de trazer", retorquiu o sr. Santos sem fazer ideia alguma do que pretendia o Al Trokas. 
"A senha, Santos, a senha, porra, sabes lá se eu sou algum agente infiltrado do SIS, um sósia de mim mesmo", recordou-lhe o Al Trokas. 
"Bom dia", desejou rapidamente o sr. Santos. "Bom dia", respondeu o companheiro infinitamente revolucionário. 
Para quem não tem acompanhado com atenção a saga do sinistro grupo subversivo IRRA, "Bom dia" é a senha que circula entre os componentes da intratável organização e "Bom dia" a contra-senha da mesma. Quem não cumprir este esquema de segurança básico é imediatamente abatido ao efectivo...Atenção, que "abater" tem vários significados, ok? 
"Bom dia, Bom dia!" (assim mesmo em duplicado), ouviu-se à chegada do sr. Costa, o terceiro insurgente do explosivo. 
"Bom dia", contra-senharam (ohpá os neologismos dão cá um jeitaço...) os dois camaradas. 
"Vocês ou é tudo ou nada -- observou o Al Trokas -- ontem vinham fardados à laia de baldas das "manifs", hoje vêm os dois de igual, como o Dupont e Dupont, ou aqueles gajos dos filmes do FBI que não precisam de mostrar o crachat para se adivinhar à légua que são bófias federais". 
O sr. Costa e o sr Santos olharam-se mutuamente e realmente assemelhavam-se a gémeos naturais e não àqueles gémeos em que um é filho do leiteiro e  o outro do padeiro...Óculos escuros, camisa, gravata, sapatos, tudo exactamente igual. Como se os dois estivessem a ver-se ao espelho. 
"Olha, Al Trokas, acaba lá com a merda dessas censuras com as roupas. Estás para aí mais despenteado e porcamento comprido e desgrenhado que a Aurora quando acabam os bacanais lá no oitavo andar, umas calças de ganga mais gastas que as vacas do Zeca do Talho, uma, como se chama essa merda?, um pólo, é isso, cor-de-rosa foleiro como os coletes de trânsito da GNR ou o baton da Beiçolas e umas chancas que em tempos foram uns sapatos de vela mas deviam eram estar no estaleiro em doca-seca para conserto ou então metê-los ali na caixa do lixo do candeeiro e estás sempre a criticar os outros, chiça, acalma-te!", irritou-se o sr. Santos. 
"Então o que se faz por aqui hoje?", cuscuvilhou o sr. Costa. "O Trokas estava a falar em apalpar com o Al Trokas mas só ouvi um bocadinho da conversa", elucidou o sr. Santos. 
"Conta lá, companheiro, no IRRA não há segredos", pediram ao agora amuado amigo, depois do enxovalho sobre o seu aspecto anarco-desarranjado. 
"Isto não tem nada com o Irra, camaradas -- explicou o Al Trokas, que após breve hesitação, resolveu desvendar o segredo -- Vocês lembram-se quando a sapataria ali de cima foi vendida e os africanos compraram aquilo para fazer um cabeleireiro de penteados daqueles esquisitos que eles usam? Pois bem, um dia cheguei aqui ao café e vinha cheio de pressa com o vício do tabaco a apertar que se acabou o tabaco durante a noite. Vocês sabem como eu sou quando quero uma coisa e não tenho, não é? (os amigos acenaram afirmativamente com a cabeça). Então encontrei o Lelo atrás do balcão a atender a preta ali do cabeleireiro, que era um figurão, como vocês se devem lembrar (os amigos concordaram mas rectificaram "figurão" para "colosso"), aproximei-me deles mas desconfiei que ali havia marosca. E havia mesmo. A gaja tinha pedido 50 contos ao Lelo e o malandro, como a casa estava vazia, disse-lhe que só lhe emprestava o dinheiro se a deixasse apalpar toda. Ela disse que sim. Mas o sacana nunca mais se despachava com o assunto e eu ali a sofrer com a faltaa de nicotina na tola. Até estava zonzo. E eles nada. Subiram-se cá as hormonas ao juízo e perguntei-lhe se eu a podia apalpar em vez do Lelo e arrumava-se o "negócio" de uma vez por todas. Ela olhou para mim, mediu-me dos pés à cabeça, se calhar ficou excitada com o meu pijama bem apertado e os chinelos de quarto de peluche em forma de banana e disse-me que sim. Não perdi tempo e desde as unhas dos pés até às pontas das extensões acho que não deixei um centímetro quadrado da tipa por observar com os dedos. Finalmente o Lelo deu-me o maço de cigarros e desapareci dali para fora antes que o ambiente aquecesse mais. O resto não sei que o Lelo não se descose !"
"Isto por estas bandas não é uma revolução que precisa -- comentou cinicamente o sr. Santos como se ele fosse algum santo -- o que está a precisar mesmo é de uma rusga da polícia de costumes !" 
"E se deixássemos as poucas-vergonhas aqui do sítio e tratássemos dos assuntos do IRRA", disfarçou o sr. Costa, um malandro mais manhoso com as mulheres com pior fama no meio que a de todos os políticos juntos que nos governaram desde o 25 de Abril". 
"Camaradas, depois da fundação e dos estatutos precisamos de um hino para quando passarmos as mensagens nas televisões e nas rádios", considerou o Al Trokas. "Alguma coisa que chame a atenção das pessoas com uma música tipo pum-pum-pum..."
"Marcial? Rammstein?...Balada?, assim como a trova do vento que passa e as notícias do meu país...", divagou o sr. Santos. 
"Não é nada dessas mariquices...-- interrompeu logo o sr. Costa -- não somos o Trio Odemira para ir cantar nos bailes das sopeiras e dos soldados no Mel e Pulgas (a catedral do marmelanço dançante na Lisboa dos anos 60-70-80) nem somos nenhumas deolindas choronas sem cheta para ir prós copos no Bairro Alto". 
"Estou a ver que posso contar com vocês para algo heróico, empolgante, que leve mais de 1 milhão de gente exaltada atrás de nós de Avenida da Liberdade, em direcção aos antros dos políticos corruptos -- entusiasmava-se o Al Trokas, trauteando a Aida a "Grande Marcha" -- Recordem-se, companheiros que a Itália se unificou atrás da banda música do Giuseppe Verdi". 
"Não pode ser nada do Wagner? -- perguntou o sr. Santos -- Esse gajo também é transcendental. Também não leva menos de 1 milhão atrás dele nem que seja pela Rua da Betesga".
"Não -- recusou o Trokas -- a música desse gajo é perigosa. Ainda vem aí a NATO enfiar-nos uns mísseis aqui na esplanada, com a desculpa que estamos a formar o IV Reich". 
"Era dia de revoltados..."--susurrou o sr. Costa, despertando a atenção dos amigos. 
"E os portugueses exaltados" -- continuou o sr.Santos, enchendo o peito de ar. 
"Resolveram que é desta" -- acrescentou o Al Trokas, já a marcar o compasso.
"Desatou tudo ao molho" -- cantarola o sr. Costa, tamborilando os dedos na mesas. 
"E o político zarolho" --  batuca o sr. Santos. 
"Levou com o IRRA na nesta" -- conclui o Al Trokas. 
"Hip, hip, IRRA !; hip, hip, IRRA !, hip, hip, IRRA !", festejaram os três amigos, companheiros, camaradas, cúmplices e fundadores da caótica organização multi-funcionalmente subversiva. 
E acabaram este capítulo fundamental do diabólico grupo anti-sistema cantando a plenos pulmões o hino ainda mais fresco que os polvos do Lelo. 

ERA DIA DE REVOLTADOS
E OS PORTUGUESES EXALTADOS
RESOLVERAM QUE É DESTA
DESATOU TUDO AO MOLHO
E O POLÍTICO ZAROLHO
LEVOU COM O IRRA NA TESTA




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