quinta-feira, 21 de julho de 2011

A bomba do IRRA



O IRRA, a tremenda força clandestina anti-corrupção política, anti-sistema e 
anti-aquela lenga-lenga que o Al Trokas  já por aqui descreveu há uns capítulos atrás, mas já não ele se lembra muito bem do que por aqui vai acontecendo porque a porra da idade e o avanço do malfadado Alzheimer já vai fazendo das suas e minando o cérebro como uma bicha-solitária comodamente instalada nas merdelhices dos intestinos. 
Ainda ontem, Al Trokas em vez de colocar  as pastilhas de Skip na máquina de lavar loiça encheu o depósito da   velhota AEG comprada a prestações suaves, tão suaves que o dono da loja de electrodomésticos nem deu por elas, de meia embalagem de Fary. Horas depois, quando pretendia entrar na cozinha, esta encontrava-se submersa num mar de espuma que cobria a banca, o vetusto micro-ondas mais o lava loiça e os pratos de comida dos gatos, que se empanturraram com uma perna de peru exposta ao sol na varanda para descongelar e enfardar ao almoço com um pacote de batatas fritas com sabor a presunto. 
Na noite anterior, a distracção (será só isso?) antes de se deitar, Al Trokas pôs um sapato a carregar em vez do telemóvel que só tem caracteres chineses porque o livro de instruções percebe-se menos que o tipo gago do 7ºE e ouve-se menos que a vizinha do 2º C sussurrar ao vizinho casado do 2ºB "vá, entra, antes que a tua mulher nos veja". Depois de fumar um cigarro na retrete,  o  componente do temido e procurado IRRA, limpou o rabo a chuviscar da lavagem higiénica no bidé com sabão azul à camisa de seda tailandesa amarelo-periquito comprada nos saldos Dª Helena trocando-a inadvertidamente   à toalha turca azul com um patinho bordado numa das pontas, deixada lá por casa por uma ex "unida de facto" que não achou muita graça prenda de anos meladamente oferecida por Al Trokas, um roupão sexy vermelho que uma streap-teaser da Reboleira lhe atirou sugestivamente para a cara quando se despia sensualmente para um público na sua maioria composto por trolhas saídos da "ferrugem" no turno da meia-noite que se babavam nos copos de uísque marado forjado pelo Etelvino, um ex-proxeneta do Intendente que conhecera Al Trokas numa rixa à navalhada no célebre antro de mulhares de paixões ao minuto,de taxímetro sempre a contar,  conhecido por  "Istambul", como  os mais velhos que passam os olhos por aqui devem reconhecer pelo menos de nome.  
Naquela catedral do vício "atacava" uma loira quase anã e marreca conhecida por todas as aves nocturnas de Lisboa como a "boca do inferno", que palmilhava os passeios da Rua Artilharia 1 até ao "Apolo 13" do Bairro Alto.  Uma noite, estava Al Trokas a conversar com a "Marreca do Istambul" sobre a crise do petróleo de 1976 (duvido que fosse este o tema do diálogo mas também não vamos desconfiar de tudo e todos) e foi de cana, juntamente com cinco vadios mal-encarados, sob a mira da pistola Walther 6,35mm do temível chefe  da esquadra das Mercês, "O Bailarino", que acabara de sair do hospital de São José por ter levado um enxerto de porrada monumental de um bando  de chulos, já fartos de lhes estragarem o negócio, que lhe partiu quatro costelas, o maxilar em dois lados, meia dúzia de dentes e rachado a cana do nariz.  
O mandante policial, assim que acabou a baixa forçada,  organizou esta  rusga que levou Al Trokas e quem mais lhe aparecesse pela frente para enfiá-los nos calabouços da célebre esquadra que faria borrar de medo o histórico inquisidor Torquemada que tinha a mania de mandar cozinhar os hereges nas fogueiras dos actos de fé no Rossio. Como a malta que seguia sob prisão em bicha-pirilau pela Rua de "O Século" abaixo não se movia com a ligeireza que ele pretendia, o "Bailarino" disparou dois tiros para juntos dos pés das suas presas. Ao som seco daquela pistola apaneleirada seguiu-se o silvo das minúsculas balas a fazerem ricochete no empedrado da rua com o nome do defunto jornal encerrado anos mais tarde por Manuel Alegre, então secretário de Estado da Comunicação Social, por não se vergar à nomenclatura socialista que sucedeu à era gonçalvista do Verão Quente de 75. 
Na esquadra das Mercês, o ambiente não era menos aterrador que a caça às bruxas na Idade Média. Os detidos começavam logo por ser agredidos pela sentinela com a coronha da Uzi e subiam as escadas impelidos a  socos e pontapés dos diligentes guardas.
Quando Al Trokas ia ser sujeito ao mesmo "tratamento" e ficar sem mais alguns dentes, o "Bailarino" deu uma ordem ao polícia de plantão à porta antes que ele descarregasse a pistola-metralhadora israelita nas ventas do agora insuportável insurgente do IRRA. "Não lhe batas. Manda esse gajo ao meu gabinete". Al Trokas entrou no cubículo onde o "Bailarino" delineava os seus planos muito sui-generis de combate ao crime, confessando os inocentes a sua inocência à chapada e os culpados reconhecendo a sua culpa à força de tabefes. O imperador policial do Bairro Alto puxou de um exemplar do "Record",  folheou umas páginas e perguntou a Al Trokas: "Este cabrão da fotografia não é você? Se não é tem um focinho igual ao seu...". O detido olhou a fotografia e confirmou que era ele mesmo na foto. Depois de se identificar com o Bilhete de Identidade, a Carteira Profissional e os cartões do "Record" e do "Diário Popular", Al Trokas foi supreendido com uma manifestação exemplar de respeito pela liberdade de Imprensa quando o "Bailarino" lhe colocou uma mão sobre o ombro e lhe disse que contasse sempre com ele porque tinha ali "um amigo". Depois de apertarem as mãos, o chefe berrou para o atónito sentinela: "Ó sua besta, deixe sair em paz este senhor que é meu amigo !". 
O "Bailarino" transfigurara-se qual Dr. Jekyll and Mr. Hyde... 
Al Trokas, o sr. Santos e o sr. Costa, os desumanos fundadores do infernal grupo indiscretamente subversivo do IRRA, estavam misteriosamente ausentes da esplanada do café-restaurante "Dentada" para infelicidade completa do Lelo que passou a tarde sem vender uma bifana, apesar do monumental letreiro "À caracóis i caraculetas" visível do Cabo Espichel a 30 quilómetros em linha tão recta como as curvas  da enfermeira Geraldina do 9º F aqui do  Lote 69.
Os resistentes anti-sistema corrupto dos políticos encontravam-se na sede do IRRA numa azáfama que deixaria o SIS em alerta máximo, a PSP e a GNR recolhida nas suas míseras e arruínadas instalações, os quartéis de prevenção e os políticos desonestos em fuga a caminho das suas off-shores onde estão depositadas a maioria dos impostos dos portugueses.   
"Os produtos aparentemente inocentes que todos temos nos armários da casa-de-banho -- leccionava Al Trokas para os sanguinários camaradas sr. Santos e sr. Costa e a nóvel secretária Victoria Rabanova -- são compostos por substâncias químicas que chegam e sobram para fazer bombas que enviariam para as nuvens os cus chamuscados esses pulhas que nos andam a explorar com PEC's e dívidas soberanas mais a puta que os pariu".
Veteranos da Guerra de África, Al Trokas, o sr. Santos e o sr. Costa relembravam algumas das "engenhocas" que improvisavam quando faltavam no arsenal do Exército Português os "produtos" mortíferos aprovados pelas exigentes normas da Convenção de Genebra, da Declaração Universal dos Direitos do Homem, do Tribunal Penal Internacional, a Cruz Vermelha Internacional e outros gajos que só empatam quando a rapaziada se quer matar uns aos outros...
"Eu lembro-me dessa trapalhada toda -- interveio o sr. Santos -- lembram-se quando fizemos uma emboscada a um grupo de turras que se infiltravam  do Zaire?..."
"Ena pá, não me recordes isso -- interrompeu-o o sr. Costa -- que  grande embrulhada por causa do observador da ONU. Os gajos do IN (termo militar que designa Inimigo) deram pela nossa presença por causa do cabrão desse burocrata das Nações Unidas e começaram a disparar raivosamente na nossa direcção com as AK-47, PPH's, Simonov e até uma "ceifadeira" Maxim e o malandro não nos deixava ripostar por causa dos direitos humanos. Não era permitido atingi-los na cabeça, coitados, que lhes estragávamos o penteado, nos braços também não podia ser porque depois não poderiam trabalhar na agricultura e a mulher, as quatro amantes, os 26 filhos, mais o avô e a avó ficavam sem o chefe de família que declarasse o IRS às Finanças da FNLA, nas pernas ainda menos para não ficarem mancos e serem chacota da criançada lá na aldeia "olha lá vem o coxo" que os miúdos para gozar com a desgraça alheia são piores que diabretes."
"Ainda bem que o cabo Alípio -- completou a epopeia Al Trokas -- deu uma traulitada na tola daquele empata fodas e deixou a malta "trabalhar" à vontade senão não estávamos aqui a para perseguir os corruptos que nos levaram à desgraça." Quando recuperou os sentidos, dissemos ao "onu" finlandês que tinha sido um gorila que lhe tinha dado com um galho nos cornos e só não o enrrabou porque lhe demos uma banana da nossa ração de combate.
O cabo Alípio era um castiço produto da Madragoa, fino como um pau de vassoura, um bocado desarrumado da cabeça, que casou com uma mulher mais velha e 62,865 quilos mais pesada que ele. O gabarolas ufanava-se em público de ter dado 14 "pranchadas" à mulher na noite de núpcias, enquanto viam revistas e filmes pornográficos de 8mm. "E não foram 14 voltas na cama, foram mesmo 14 sem tirar", explicitava entrando em pormenores que não podem ser reproduzidos neste texto para inocentes leitores dos 7 aos 77 anos. 
Por onde passava, o cabo Alípio arranjava sempre um emaranhado de sarilhos. Encontrava-se no nosso grupo de combate em primeira instância devido a um castigo imposto pelo comandante do Regimento de Infantaria de Braga, onde era responsável pela pecuária do quartel, desde as couves e as cenouras aos porcos, patos e galinhas. Corria pela unidade o boato de que ele andava a insinuar-se a uma porca que acabara de parir uma ninhada de leitões. Chamado ao gabinete do comandante, o ríspido coronel perguntou-lhe se os rumores correspondiam à realidade. O cabo Alípio, direito como um pilar da Ponte Sobre o Tejo, deu a sua versão: "É uma elifântia (às vezes tropeçava na Língua de Camões quando tentava esgueirar-se ao vernáculo habitual com que se fazia entender mas quem lê isto já deve ter discorrido que ele pretendia dizer "infâmia"), meu coronel, nunca me meti com a porcaria da puta...desculpe...a putaria da porca...perdão...a porca da porquinha...a porca...até porque ela foi mãe há pouco tempo e não deixa ninguém fazer porcarias com ela, a pu...a porca".
O coronel mandou-o destroçar e sair mas o cabo Alípio nunca conseguia fechar a boca a tempo de sair asneira e quando ia fechar a porta do gabinete do oficial supremo espreitou e disse com um sorriso enigmático: "Mas, meu coronel, andam por lá umas galinhas que me deitam uns olhinhos..."
"Fora daqui, seu palhaço -- berrou-lhe o comandante -- vou transferi-lo para o mais longe daqui que puder! Para o diabo que o carregue!"
O pobre do cabo Alípio recebeu ordem de marcha para o Regimento de Cavalaria de Estremoz. Mas a estada nessa unidade também não lhe correu de feição. Foi colocado na horta do quartel e passava o dia a cavar e a semear e  a apanhar alhos, cebolas, batatas e outros produtos para a panela do rancho. O nosso amigo chegava à noite estafado, com as cruzes das costas doridas, as mãos gretadas pelos paus ásperos dos sachos, sacholas e enxadas e não se conformava com a boa vida da mula do regimento que passava o santo  tempo pachorrenta a moer a moer e remoer fardos de palha. 
As ideias, geralmente más, que fervilhavam na mente do cabo Alípio levaram-no a atrelar um arado à mula, o que lhe evitaria a canseira de andar a cavar de sol a sol. No entanto, falhou um pequeno pormenor à "descoberta da pólvora" do excêntrico e descuidado militar. O quadrúpede perissodáctilo não estava habituado à parafernália de arreios  e espantou-se arrastando atrás de si  em correria imparável a afiada cunha do arado. O incidente aconteceu no preciso momento em que se fazia o render da parada, às 14h00, nem um segundo a mais ou a menos, com o comandante e os seus oficiais perfilados em frente aos esquadrões rigorosamente alinhados ao milímetro, como é norma nas unidades de Cavalaria. 
As botas engraxadas exaustivamente e os distintivos com as duas espadas cruzadas nas boinas pretas e nas bandas dos blusões resplandeciam ao sol de Verão quando a mula apareceu num galope desvairado com o malvado arado atrelado, traçando uma cicatriz no imaculado alcatrão de uma parada limpa até à paranóia por ordem do comandante que a exigia lavada e higiénica capaz de bebé poder comer a papar do chão sem borrar a fralda com uma diarreia bacteriana. 
O pandemónio instalou-se no disciplinado e orgulhoso  Regimento de Cavalaria de Estremoz quando a mula investiu sobre o coronel que caiu do alto das suas botas altas até ao joelho sobre os aterrorizados segundo comandante, um tenente-coronel vaidoso da sua árvore genealógica cujos ramos mais afastados ainda faziam uma pequena sombra a D. Afonso Henriques, e o major de Operações, um veterano condecorado da guerra na Guiné, onde nunca tinha passado por um aperto semelhante. 
A espantada mula deu meia volta e enfiou-se pelo meio dos esquadrões dos anteriormente aprumados soldados agora em fuga deste furacão de quatro patas que continuava a lavrar o chão da parada atrás de si em vez da horta do pobre cabo Alípio. O assustado animal só se deteve quando o arado ficou preso no cabo de reboque de uma Berliet junto às oficinas, uma oportunidade que o mecânico Abrantes não perdeu para segurar a possante mula com os seus não menos possantes braços peludos até dois pelotões de orgulhosos cavaleiros caírem sobre ela e imobilizarem-na apesar dos fortes coices que chutava em todas as direcções até acalmar quando a despojaram da escravatura dos insuportáveis arreios. 
O coronel, assim que recuperou do inesperado ataque, assinou uma guia de marcha para o cabo Alípio e foi assim que ele chegou ao grupo de combate de Al Trokas, o sr. Santos e o sr. Costa. 
Entretanto, no 10º andar do Lote 69 desenrolava-se uma cena sinistra. 
"Olhem para a nossa secretária Victoria Rabanova -- mandou Al Trokas -- Ela por si só já é uma bomba!"
"Obrigada, Al -- agradeceu a estonteante romena ajeitando a mini-saia e os cabelos brilhantes e sedosos -- és sempre tão querido e carinhoso para mim".
Al Trokas pigarreou, o sr. Santos mirou-lhe os seios em fuga de uma camisa justa e o sr. Costa mediu-lhe as longas e torneadas pernas ao milímetro. 
"Sim, minha querida Victoria -- explicou Al Trokas -- mas agora a palavra bomba não era nesse sentido".
E virou-se para os indefectíveis amigos: 
"A nossa simpática e dedicada secretária usa alguns dos produtos essenciais para fabricarmos a nossa bomba. Tira o verniz das unhas com acetona. Certo? (Ela acenou afirmativamente com a cabeça). Faz madeixas com tinta para cabelo. Certo? (Ela esboçou um  sorriso sensual ao mesmo tempo que puxava com os dedos uma franja de cabelo para a frente dos belos olhos rasgados). Há por ali diluente para tirar a tinta de esmalte. Certo? (O "Átila", o terrível e assanhado gato que quase assassinara o pintor contratado para pincelar a sede do IRRA e fugira a sete pés abriu os olhos e enroscou-se mais comodamente ao sol no parapeito da janela). Temos desinfectantes, álcool e água oxigenada. Certo? E há por aí desentupidor das retretes. Certo, ó Santos? (O visado cada vez que usava a sanita deixava a pia mais engarrafada que a Segunda Circular nos dias em que o Benfica e o Sporting jogam à mesma hora na Luz e no Alvalade XXI). Portanto não nos falta nada para fazermos umas  bombas caseiras como os doces conventuais, rapazes."
Os elementos inapelavelmente anti-sistema do IRRA reuniram aqueles inocentes e inofensivos ingredientes e deitaram as mãos à obra bombástica na cozinha  labotarial do 10º andar panorâmico do Lote 69. O trabalho  potencialmente explosivo deles era algumas vezes perigosamente delicado devido à curiosidade da secretária Victoria Rabanova, que ao espreitar sobre os ombros dos três intratáveis perseguidores dos políticos anti-corruptos roçava com os seios altamente alpinos nas costas dos homens ocupados, o que lhes fazia tremer as mãos e desconcentrarem-se das misturas e das quantidades exactas das fórmulas. 
O primeiro engenho explosivo foi confeccionado a partir de um cocktail de diluente, álcool e tinta da cabelo e cuidadosamente arrumado numa prateleira atrás de um frasco de malaguetas e de uma lata de cogumelos. O segundo era mais perigoso e potente, um triperóxido de triacetona, composto de ácido súlfurico extraído do desentupidor das retretes, peróxido de hidrogénio mais popularmente reconhecido e usado como água oxigenada e acetona. Este TATP (nome técnico dado pelas polícias de todo o Mundo) é particularmente mortífero e foi armazenado atrás de latas de dobrada e grão com mão de vaca já cozinhadas compradas no mini-mercado. O arsenal do IRRA começava a compor-se no armário da cozinha da sede do IRRA. 
De repente, um estrondo ribombante ecoou pela casa. Os três amigos atiraram-se de imediato para o chão com reflexos ainda não muito afectados pela idade e por coincidência, ou talvez não, ficaram todos estendidos sobre a escultural secretária Victoria Rabanova. "Morremos?", perguntou ela quase asfixiada sob o peso de Al Trokas, o sr. Santos e o sr. Costa. Olharam uns para os outros até descobrirem que a origem do barulho tonitruante fora causado pelo irrequieto gato "Átila", que atirara ao chão o vaso com orquídeas que a Victoria Rabanova colocara no parapeito da janela que dava para o terraço. 
O bombástico IRRA estava preparado para qualquer eventualidade.












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